Entrevista a Nero (9) — pela leitora Ana Vieira Vicente
- Outro
- 22 de ago.
- 3 min de leitura

Ana Vieira Vicente é entusiasta amadora de várias temáticas relacionadas com história, antropologia e artes e humanidades, tem desenvolvido desde 2019 várias iniciativas de divulgação nessas áreas e tendo-se especializado na prática de entrevistas e moderação de debates dedicados a esses e outros tópicos.
Coloca as seguintes questões:
AVV — Como encontra inspiração para começar uma nova história?
N — Bem, referir-se-á sobretudo ao caso do Oceano — O Reino das Águas, presumo. Os livros que se seguiram a esse são, para já e essencialmente, poemários. O Oceano é um longo poema narrativo: funde a alta fantasia aos moldes da epopeia clássica. Nesse caso, começou por surgir-me, no pensamento, a imagem do homem na praia, do clarão, da deusa. A cena do primeiro canto, do chamamento. Influenciado pelos mundos fantásticos que descobria na altura (tinha 15 anos), vi-me impelido a construir uma história, um universo... Mal imaginava eu, na altura, a complexidade e as proporções que tal plano atingiria. Para livros futuros, que abracem narrativas "de fôlego", tenho algumas ideias embrionárias, mas não tenho planos concretos.
AVV — Tem algum método de criação de personagens? Como se processa?
N — Não creio. Começo por ter uma ideia e uma visão geral do papel que essa personagem terá na história. Depois, passo a listar-lhe um sem número de características, a definir-lhe uma determinada árvore genealógica. De seguida, encarrego-me de desenvolver a história. A personagem surge, age e relaciona-se — com as outras personagens e com aquele mundo. E a forma como se desenvolve não é condicionada por alguma espécie de rigidez da lista inicial. Desenvolver-se-á de forma fluida e aberta a alterações.
AVV — Qual foi o maior desafio que enfrentou no seu processo de escrita?
N — Terá sido escrever o Oceano. Demorei dezoito anos para concluí-lo. Começar a escrever uma história, ainda que épica, é relativamente fácil. Desenvolvê-la com detalhe é extremamente exigente. Porém, o mais difícil é mesmo a fase de conclusão: atar todas as pontas é um trabalho verdadeiramente hercúleo. Foi esse, sem dúvida, o maior desafio que enfrentei. Terminar o Oceano levou-me à beira da loucura. Acabei-o, mas bastante desgastado.

AVV — O que o motivou a ser escritor a par do seu trabalho enquanto docente?
N — O sonho — pode-se dizer sonho, ainda, sem que o discurso soe demasiadamente infantil ou perca credibilidade? — o sonho de ser professor surgiu em criança. Teria seis ou sete anos e já brincava aos professores e alunos com os meus amigos da altura. A ideia de ser escritor terá surgido lá para os onze anos, quando comecei a escrever livrinhos no 6º ano. Ganhou maior preponderância a partir dos quinze, quando comecei a escrever o Oceano. A vocação da docência, contudo, ver-se-ia adiada e, curiosamente, a poesia e a publicação acabariam por surgir antes da concretização da docência. Exercê-las em simultâneo foi uma inevitabilidade da vida, da minha realização pessoal e profissional. Não obstante, apesar de me fazer muito feliz, a docência ocupa-me muito tempo. Gostaria de ter mais tempo para me dedicar de corpo e alma à poesia.
AVV — Qual foi o lugar mais inusitado onde lhe surgiu uma ideia para escrever?
N — É uma questão interessante, que levaria a respostas eventualmente curiosas e engraçadas. Na verdade, as ideias não escolhem lugares para surgirem, verdade? Já me terão surgido ideias em tantos lugares... devo ter versos do Oceano escritos pelos manuais ou cadernos da Secundária, se esses ainda existirem... Quantas ideias não me surgiram quando estava para adormecer e me levantei para registá-las? Talvez um sonho seja um lugar suficientemente inusitado. Algumas das cenas mais surrealistas do Oceano surgiram-me em sonhos.

Instagram de Ana Vieira Vicente: @ana.vieira.vicente
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